Intoxicação aguda por pesticidas: importância da informação circunstancial nortear a investigação médico-legal
DOI:
https://doi.org/10.51126/revsalus.v7isup.1023Keywords:
intoxicação; suicídio; pesticida; investigaçãoAbstract
Introdução:
O suicídio em Portugal continua a representar uma desafiante problemática social com múltiplos contornos relevantes para a prática da medicina legal e das ciências forenses. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, a taxa de mortalidade por suicídio nacional em 2022 foi de 9,9 por 100.000 habitantes. As intoxicações por substâncias medicamentosas e outras compreenderam 9,2% dos casos, com uma tendência mais prevalente deste método em mulheres.
O uso disseminado de pesticidas leva a que estas substâncias sejam por vezes utilizadas com intuito suicida. Segundo o Centro de Informação Antivenenos, em 2023, das 25.091 situações de exposição humana a tóxicos, houve 216 casos de exposição a herbicidas (0,86%), e 539 casos a inseticidas/acaricidas (2,16%). A ubiquidade dos organofosforados torna-os no grupo de pesticidas mais utilizado neste contexto, devendo, contudo, o perito manter-se atento a outras possíveis substâncias.
Material e Métodos/Relato de caso:
Apresentam-se dois casos de suspeita de intoxicação por pesticidas submetidos a autópsia médico-legal:
1 – Mulher de 86 anos, sem antecedentes psiquiátricos conhecidos, encontrada no chão da sua cozinha junto de embalagem vazia de deltametrina (inseticida piretroide). As roupas encontravam-se manchadas com substância esbranquiçada de odor intenso. Observou-se a presença de substância de características semelhantes no estômago, e um padrão reticulado avermelhado disperso na mucosa gástrica; bem como petéquias avermelhadas dispersas pela mucosa infraglótica. Foram colhidas amostras da embalagem referida, do conteúdo gástrico e de sangue periférico, tendo todas testado positivo para deltametrina.
2 – Mulher de 64 anos com antecedentes de síndrome depressiva e de tentativa de suicídio prévia por ingestão de pesticida terá contactado telefonicamente a sua filha informando que teria ingerido voluntariamente diquato (herbicida). Foi levada a um serviço de urgência onde realizou lavagem gástrica e foi internada em unidade de cuidados intensivos. Nas 48 horas seguintes apresentou evolução desfavorável com falência multiorgânica refratária a medidas terapêuticas. Em sede de autópsia observaram-se áreas de infiltração hemorrágica e erosões da mucosa oral, da faringe e esófago, e o estudo toxicológico confirmou presença de diquato no líquido recolhido da cavidade oral, no conteúdo gástrico e no sangue periférico.
Discussão e Conclusões:
A intoxicação aguda voluntária apresenta-se como uma relevante causa de suicídio em Portugal. Apesar da predominância das intoxicações com substâncias medicamentosas, o perito deve recolher e analisar informação circunstancial para melhor adequar a investigação médico-legal, em particular atendendo à frequente inespecificidade dos achados autópticos nestes casos, e à necessidade de realizar colheitas e exames complementares menos usuais.
Assim, a compatibilização entre a informação circunstancial, os achados autópticos e mormente os resultados dos estudos toxicológicos realizados permitiu estabelecer a causa de morte em ambos os casos como intoxicação aguda, que se coadunava com um diagnóstico diferencial médico-legal suicida.
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